18/11/2013

Arquitetura e Arte



ARQUITETURA E ARTE

Digamos que vivemos em uma sociedade apaixonada pela beleza. São pessoas que consomem sua paixão e que gostariam, na sua expressão máxima, viver o mais perto possível da beleza atingida pela arte. A arquitetura foi isso em seu remoto passado. Desenvolveu-se a partir da história da beleza, e não raras foram as vezes em que ajudou a dar o próximo passo. Assim sendo, arquitetura e arte foram como gêmeos siameses por boa parte de sua história. A grande dificuldade de separá-las nas últimas décadas se deu pela genuinidade que tratou de determinar o que é arte e o que é design. Essa diferenciação veio em tempos recentes e, talvez por motivos mais econômicos do que sentimentais, a arquitetura decidiu seguir a nova vertente que nascia da arte. Obviamente que qualquer texto sobre arte e designer pode trazer mais questões que respostas, além de respostas inflamadas sobre como a arte morreu e o designer salva o nosso dia a dia estético, mas enfim… Precisamos tentar.




Quando abrimos velhos e bons livros de história da arte (e os lemos) nos deparamos com uma história muitas vezes confusa e organizada de forma linear, o que sabemos que é o que geralmente não acontece, mas ficamos satisfeitos com a grande maioria dos resultados de tal leitura. E entre muitas das conclusões que podermos retirar de tais leituras, uma fica bem clara: arquitetura e arte acompanharam-se por grande parte de sua história, assim como uma sempre influenciou fortemente a outra. Não teríamos indícios tão fortes para diferenciar arte gótica da barroca, por exemplo, se não pudéssemos olhar tanto para os quadros da época como para as catedrais nas quais eles estavam inseridos. E ao longo de boa parte da história investigativa artística nos depararemos com conclusões parecidas. Mas podemos atentá-las ainda hoje? Acredito que não.
Se nos dirigirmos ao passado, aos seus séculos 15, 16, 17, 18 e 19, não podemos conceder a arte como a concedemos hoje. De fato, a produção artística da época dedicava-se a um fim específico de satisfação pessoal ou constitucional. Os artistas criavam obras tendo contratos com igrejas, ou senhores feudais, ou reis ou simplesmente pessoas realmente ricas. Arte tinha um propósito, e apenas o que cumpria seu propósito era considerado arte. Se substituirmos a palavra “arte” da última oração por “design”, poderemos nos transportar facilmente ao século 21, mas deixemos este argumento para um pouco adiante. A verdade é que arte não se diferenciava do modo pelo qual a arquitetura também era pensada, e exatamente por isso é que as duas evidentemente não se separavam.
Os tempos passaram a tramar contra sua fidelidade assim que a modernidade chegou. A sociedade, mudada, inseria-nos meias artísticas pessoas declaradamente perturbadas, além daquelas que viam nas ciências humanas o futuro da vida social, e a teoria abarcou-se nos lindos campos pintados equilibradamente pelos grandes mestres, poluindo seus pontos de fuga e fazendo seus Baços e Madonas darem pulos raivosos. A arte passou a ser “coisa mental” e sua utilidade foi bruscamente questionada. Por outro lado, o design têxtil e gráfico, que acompanhava o cotidiano de uma faixa cada dia maior de pessoas, devido à revolução industrial e o considerável aumento de pessoas que poderiam pagar pela “arte” produzida em grande escala, começou a angariar cada dia mais fãs. E assim criaram-se panos de prato de natal, jogos de porcelana vagabunda pintadas por máquinas e todos os produtos presentes em lojas chinesas. O que surgiu foi uma bifurcação na conturbada estrada da história: a arte represou-se no senso crítico de uma minoria, limitando-se à apreciação de uma escala reduzida de pessoas, enquanto o design abria os braços e recebia tudo o que era novo e agradável esteticamente para uma massa consumidora que crescia (e cresce) a cada dia que se passava na terra. Bi polarizado o mundo da beleza (e eu tenho quase certeza de que a arte deve ser considerada a Alemanha comunista), a arquitetura se vê obrigada a escolher um lado. Seria estúpido, ou inocente demais, acreditar que ela escolheria o braço que lhe renderia menos público e, por isso, menos dinheiro. Talvez também por que seja, afinal de contas, uma avassala de segundo grau da matemática, não pôde dar-se ao luxo de afundar seus pilares no pântano ao qual a arte com tanta facilidade o fizera. Assim sendo, decidiu trilhar um ramo da árvore esquecido pela arte: a utilidade. O então abandonado conceito de utilidade toma para si tudo o que a arte delicadamente renegara, toma boa parte do seu mercado de senhores ricos e incorpora a produção em massa, a modernidade padronizara que utiliza a capacidade técnica como desculpa para abarrotar nossa vida de supostas belezas úteis (tanto quanto fúteis). Ajudando a construir a sociedade de consumo na qual estamos habilmente repousados e relaxados.


Fonte: http://www.arquitetonico.ufsc.br/arquitetura-e-arte-%E2%80%93-da-historia-a-problematica-contemporanea

Gabriel de O. Costa